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Entrevista com Blendon Cassio, um dos vencedores do Prêmio Solano Trindade 2025

Acontece nessa quarta-feira (3) na Unidade Roosevelt da SP Escola de Teatro – Centro de Formação das Artes do Palco o lançamento do livro “Eternizar em Escrita Preta – Volume 6”, mais uma edição das Coletâneas Solano Trindade.

O livro, publicado pelo Selo Lucias da SP Escola de Teatro e distribuído gratuitamente impresso e online, traz as três dramaturgias vencedoras do Prêmio Solano Trindade 2025, prêmio criado pela Escola e pela Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo.

Os dramaturgos premiados este ano foram: Blendon Cassio, com a peça “Depois do Homem”; Clarissa Roberta, com a peça “Alerta – Estado de PixAÇÃO”; e Ray Ariana, com a peça “Ínterim: Ou Como Despertam os Griôs”.

Leia a entrevista com Blendon Cassio

O seu texto vencedor foi o “Depois do Homem”. Poderia nos falar um pouco dele? O que os leitores podem esperar quando o livro for publicado dia 3/12?

“Depois do Homem” é, antes de tudo uma tentativa. Uma tentativa de acolher meus desejos de artista criador e, ao mesmo tempo, de lançar ao mundo o olhar de um jovem artista negro que se pergunta o que vem depois das certezas, das estruturas, das narrativas que nos atravessam.

É também um texto universal, que arrisca desenhar a ideia do fim desse “homem” que moldou o mundo como ele é. Um texto que dá um passo além, sem deixar de ser teatro, sem deixar de ser fábula, sem abandonar o riso, o espanto, a história.

Com certeza é um texto político porque nasce do meu corpo negro em relação com o espaço em que vivo, em relação com esse país, mas é também uma fábula envolvente, ou pelo menos a tentativa é que seja. Espero que os leitores possam sentir essa mistura de ideias e sensações que tento provocar.

Como foi o processo de escrita dessa peça?

Escrevi a peça durante minhas férias em julho. Escrevia, apagava, recomeçava, revisitava ideias, quase arrancava os cabelos. Mas foi um período importante, em que pude me dedicar inteiramente a ela.

Então a escrita durou um mês, mas esse texto já vivia dentro de mim muito antes. Estava no meu imaginário, no meu corpo, na arte que faço, nas encruzilhadas que me atravessam. Posso dizer então que essa peça está sendo escrita há mais de trinta anos, sendo resultado dos meus acúmulos de minhas experiências como homem negro e como artista.

Quais são as suas grandes inspirações dramatúrgicas e literárias e outras inspirações que agregam na sua literatura?

Minhas inspirações vêm principalmente da dramaturgia teatral, mas para “Depois do Homem” fui guiado por pensadores que desmancham a própria ideia de fim.

De dramaturgias teatrais, acredito que as obras de Brecht me ofereceram a força política da fábula.

Na literatura, tive duas principais influências: Leda Maria Martins com o “Performances do tempo espiralar: poéticas do corpo-tela”, que entre diversas ideias, revela que o corpo carrega memórias que não morrem, memórias que retornam, se reinscrevem, se presentificam. Em sua visão, nada se encerra, tudo vibra de novo.

A segunda inspiração foi Nêgo Bispo na obra “A Terra dá, a terra quer”, que através da cosmologia quilombola, afirma que não existe fim, apenas começo, meio e começo. A morte, portanto, não é fim, mas desdobramento.

Essas perspectivas foram fundamentais para mim porque, no meu texto, eu não questiono a morte, mas tento colocar um fim nela enquanto estrutura de pensamento, essa morte cristã, ocidental e colonial, que define fronteiras rígidas e, sobretudo no Brasil, insiste em destinar corpos negros ao desaparecimento.

Em “Depois do Homem”, tento matar a própria ideia de “homem” que sustenta esse imaginário da finitude e da dominação. E, no lugar desse fim imposto, proponho continuidade, reinício, multiplicidade. Esses autores me ajudaram a enxergar que não escrevo sobre morte, mas sobre aquilo que persiste, aquilo que ressurge quando recusamos os limites que nos deram.

Você é ator, além de escritor. Como esses dois campos conversam em você? Ser ator influenciou a escrita de “Depois do Homem”?

Nunca me imaginei escritor, mas sempre me imaginei ator. Desde 2013 caminho pela atuação, especialmente pela vertente do ator/criador, que é aquele que não apenas interpreta, mas cria a cena como um todo.

Ao longo dos anos, acabei criando tantas cenas que, inevitavelmente, comecei a escrever os textos que as compunham. Escrever, na minha trajetória, é fruto direto dessa prática que parte da ação. O teatro ensina a entender a dramaturgia por dentro, sempre fui muito atento ao ritmo da cena, aos silêncios, as pausas, ao impacto que uma cena pode causar. Por isso, ser ator sustenta minha escrita. Conhecer o palco abre caminhos que apenas a escrita não abriria.

Como tem sido sua experiência no curso de Dramaturgia da SP Escola de Teatro? O que tem aprendido com seus colegas e formadores?

Tem sido uma experiência de aprendizado muito importante em minha trajetória como artista. Pela primeira vez posso estudar especificamente dramaturgia e dramaturgismo, área que virou meu interesse, e ter profissionais incríveis como docentes do curso fazem a experiência ser ainda mais válida. Sem o curso com certeza eu não conseguiria organizar as ideias que coloquei na minha dramaturgia “Depois do homem”.

A troca intensa e a parceria afetuosa com os colegas de curso , as leituras de dramaturgias de diversos estilos e países, os exercícios práticos de escrita e criatividade, os feedbacks dos professores, a prática pioneira do dramaturgismo, enfim, sou muito grato pelo acesso ao conhecimento e prática que o curso me proporciona. É importante destacar que sou bolsista, e o apoio financeiro que a escola proporciona aos alunos de baixa renda é essencial para minha continuidade e para minha qualidade de aprendizado. Sou muito grato.

Quais dicas você daria para outras escritoras e escritores negras e negros que desejam escrever novas peças, fazer carreira na dramaturgia e que poderiam participar das próximas edições do prêmio?

Espaços como esse são vitais para que nós, artistas negros, possamos revelar e multiplicar nossos modos de ver o Brasil, a arte e o mundo. Então, sente-se, abra o caderno, o computador, ou qualquer outro meio por onde suas palavras desejam sair e escreva. Poetize o mundo a partir dos seus olhos. Vai sem medo de cutucar a sociedade com aquilo que sua escrita ilumina ou incomoda.

Lembre-se que nós, pessoas negras do Brasil, somos também a arte brasileira. Não se silencie. Não se boicote. O que você escreve pode ser farol para a arte do país e, principalmente, para outras pessoas negras que precisam de referências, de espelhos, de presença. Escreva para que mais mundos possam existir. Para que sejamos muitos, dizendo e criando. Para que o teatro e a negritude caminhem juntos.

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